"Não quero lhe falar, meu grande amor,
Das coisas que aprendi nos
discos...
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que
aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
Eu sei que o
amor é uma coisa boa..."
Tanta gente... Tanta
energia... Tanta vontade de mudar... Que uma hora explode. E em meio a sprays de
pimenta e tensão, nossos olhares se encontram. Já havia dias que não nos víamos
e estávamos completamente descaracterizados, mas o reconhecimento foi imediato -
será que você também me procurava? Meu coração dá pulos, meu estômago parece num
elevador. Um abraço rápido só pra matar a saudade, porque o momento não é
oportuno. Nos separamos novamente. Você volta prá saber se eu comi, pede prá
segui-lo. Some de novo. E assim, vez ou outra, nos aproximamos e afastamos,
rimos, cantamos, nos olhamos de longe. Palavras de ordem, atenção ao palanque.
Mas chega a hora de se despedir e eu nunca sei direito como
fazê-lo...
Tarde da noite, nos encontramos, frescos e renovados depois de
uma chuveirada. Você me sorri, eu te sorrio, nos abraçamos. Você brinca de
cheirar meu pescoço, eu não aguento de cócegas. Você se preocupa: "é por
causa da barba?". Você sabe que não, você sabe o que me arrepia de
verdade... E talvez por isso mesmo, faz de novo. Me chama prá detrás da
lanchonete, dividimos confissões. Há algo seu comigo - será que eu perdi?
Voltamos prá frente da lanchonete, conversamos com amigos. Você se afasta. Fica
ali, parado, quase em frente a mim. Tento me distrair com o que os outros falam,
mas só consigo contemplar seu vulto pela visão periférica. Talvez você tenha
ficado ali, me olhando de longe, por uns 5 minutos. E eu pensando se eu me
aproximava prá me despedir, ou se eu teria outra chance.
Nossos olhares
se encontraram novamente. Eu não sabia o que fazer e baixei os olhos. Quando
voltei o olhar, vi você virando devagar, andando pro seu ônibus, como quem
espera que eu corra para abraçá-lo. Assim como eu espero, quando entro no
ônibus, que você venha atrás prá falar comigo. E como você, eu não fiz nada.
Fiquei lá, parada, te olhando se afastar, sem saber o que fazer, tentando falar
por telepatia "volta!...". Esse foi nosso último momento: um contato
visual cheio de medo, uma despedida sem palavras. Não tivemos outra
chance.
Sabe lá quando teremos novamente?
(A propósito, seu negócio
ficou comigo...)
"O que tem de ser tem muita força." (Guimarães
Rosa)
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